terça-feira, 2 de outubro de 2007

Shirdi Sai Baba

Fui convidado por uns conhecidos para visitar Shirdi, uma cidade a 270 km de Mumbai, onde há um grande templo do Sai Baba.
Fomos em 3 carros, 11 pessoas, descontados os dois motoristas. A viagem de ida levou 9 horas, entre paradas para tirar água do joelho, para comer, para esperar uns trabalhos de dinamitagem da estrada, para tentar consertar um dos carros, para esperar vacas saírem da frente, etc.
Chegamos no nosso hotel 5 estrelas em Shirdi às 20h. Até todo mundo jantar, se trocar, etc, chegamos no templo por volta das 22h, quando a última função já tinha começado.
Sai Baba foi um grande guru, que viveu em Shirdi entre o final do séc. XIX e o início do XX. Gurus são pessoas de espírito elevado, que atuam como intermediários entre os seres humanos e os deuses. Sai Baba foi um homem simples, de origem desconhecida, estudioso do hinduísmo e do islamismo. Por isso hoje é venerado tanto por hindus como por muçulmanos.
O templo fica num complexo bem grande e organizado. Nesse local existe uma árvore onde teria sido visto pela primeira vez, quando ainda criança, e um fogo que teria sido aceso por ele. Há também uma estátua do mestre, em mármore, que é o principal objeto de adoração. Além dos milagres e curas que realizava (foi um grande especialista em ervas medicinais), Sai Baba deixou vários ensinamentos. Dentre eles, que para obter o que se deseja, é necessário ter e paciência.
Por volta das onze horas, já estávamos de volta ao hotel. Dois caras do nosso grupo, com quem eu ia dividir o quarto, insistiram para eu ir com eles assistir à cerimônia de lavagem da estátua do guru, um ritual que acontece todos os dias às 6h. Finalmente decidi acompanhá-los, pensando algo como "já que estou na chuva, é pra me molhar".
Acordei de surpreendente bom humor às 3h20, tomei outro banho (segundo eles, era obrigatório tomar banho imediatamente antes de sair pro templo, o de ontem não servia), um café com leite e saímos. Ao chegarmos lá, fomos a um guichê tentar retirar um passe-convite especial que daria direito a furar a fila. Por algum motivo que não ficou muito claro, o cara se recusou a dar o convite, mesmo tendo concordado na noite anterior. Teríamos que nos juntar aos seres normais. Ao ver o local por onde serpenteava a fila, parecido com os dos parques de diversões, o Mali desistiu de esperar, por causa da sua claustrofobia.
Mali é um cara bastante místico e o único do grupo que não tinha nenhum vínculo familiar com o Nick, que me convidou, além de ser também o único muçulmano. Trabalha com comércio de plásticos e aconselhamento espiritual. Faz mapas astrais e vende conquistas. Por exemplo, se uma pessoa não consegue casar, vai até ele, que desenvolve um plano de ação, que consiste basicamente em contratar pessoas para rezar pelo cliente. Ele já conseguiu colocar uma moça no Big Brother e arrumar casamento para uma atriz famosa. Ele sabia que o Brasil é um país religioso e tinha ouvido algumas coisas sobre candomblé e umbanda. Às vezes me fazia perguntas sobre a minha espiritualidade, visivelmente decepcionado com o meu ceticismo.
O outro cara se chamava Rishi e era irmão da Neha, namorada do Nick. Todos o chamavam de Babu. O cara é ator de Bollywood e acabou de terminar as gravações do seu primeiro filme. Veio conversar com Sai Baba justamente para pedir sorte e sucesso nas bilheterias. Ele até que é um cara humilde, mas não consegue disfarçar o narcisismo diante de qualquer espelho...
Eu e o Rishi resolvemos encarar a fila. Esperamos das 4h15 às 5h, quando abriram a porta que dá para o lugar onde fica a estátua e a fila começou a andar. Faltando umas 30 pessoas, fecharam a porta de novo. Então começou o arthi, que é uma cerimônia em que se fica entoando um cântico. Um telão ficava mostrando a imagem de Sai Baba e os alto-falantes reproduziam os sons, repetidos pelas pessoas. Esta foi a parte mais chata, porque nada mudava na tela e o cântico era muito monótono e totalmente incompreensível para mim.
O banho começou antes do horário previsto, por volta das 5h45. Aí foi mais interessante, porque uns monges ficavam indo pra lá e pra cá, tira pano, põe pano, passa água, enxuga, põe mais pano, colar, etc. Depois de encerrada toda a cerimônia, finalmente pudemos entrar. O Rishi ficou muito feliz, porque um dos monges prestou atenção no que ele falou sobre o filme, pegou o recorte de revista que ele tinha levado com uma entrevista dele, pediu a bênção do Sai Baba e devolveu dobrado com flores no meio. Além disso, o Rishi conseguiu ficar quase dois minutos fazendo suas preces sem ser enxotado pelos seguranças. Deitou no chão e tudo o mais. Eu fiz logo a minha prece em prol de todo o povo indiano e saí.
No caminho de volta para o hotel, o Rishi estava radiante e eu tinha ficado feliz de ter presenciado uma cerimônia tão concorrida. No final, achamos que foi até melhor não termos conseguido entrar na primeira leva, porque teríamos sido os últimos daquele grupo e ficado no fundo. Da maneira como foi, fomos uns dos primeiros a entrar e pudemos ver o Sai Baba de perto e com mais calma.
Chegamos no hotel um pouco antes das sete e ainda faltava mais de meia hora para começar o café da manhã. O Rishi fez questão de acordar o andar inteiro contando sobre a sorte fantástica que tínhamos tido, que Deus tinha nos feito passar por uma prova, para ver se ficaríamos mesmo sem o passe VIP, que depois todo o esforço foi recompensado, porque o assistente prestou atenção no que ele tinha ido pedir e abençoado a sua entrevista, etc.
Terminada a euforia, resolvi dar um mergulho na piscina. Logo depois, o Mali juntou-se a nós para o café da manhã; excelente, diga-se de passagem. Depois subimos e fomos dormir, até umas nove e pouco, quando a outra leva acordou de vez para tomar café. Eles iriam ver um arthi da manhã, com o tal do passe VIP. Eu disse que não iria, porque já tinha visto tudo. Dormi mais um pouco e uma hora e meia depois (esse foi o tempo que eles demoraram para tomar café e se arrumar), me acordaram de novo pra insistir que eu fosse. Aí eu resolvi ir, mas só para tirar fotos (da cidade e do lado de fora do templo), já que das vezes anteriores eu não pude levar a máquina, item rigorosamente proibido em todo o complexo.
Na entrada no templo nos despedimos, tirei as minhas fotos, comprei mais créditos pro celular e voltei pro hotel.
A viagem de volta foi mais rápida que a ida, só 7 horas, contando paradas e tudo. Mas acabei chegando em casa quase à meia noite, porque ainda paramos para jantar na casa da Neha. A minha sorte foi que a Internet do celular funcionou quase a viagem toda, então aproveitei pra ver meus emails e até pra escrever a primeira metade deste relato. Caso contrário, teria sido muito mais entediante. Apesar de algumas paisagens maravilhosas, a estrada era muito perigosa, assim como o comportamento dos motoristas.
Na minha última parada (o jantar na casa da Neha), vejo uma foto gigante numa parede, um tanto familiar. Alguém diz: "é Sai Baba". Como, é Sai Baba? O Sai Baba de Shirdi era um sujeito franzino, pele escura, vestes brancas, uma bandana na cabeça. Este aqui era mais gordo, mais alto, vestia roupas laranjas e tinha uma cabeleira "black power". "Esse está vivo, mora no sul da Índia." Putz, pensei, fui ver o Sai Baba errado. O Sai Baba que é conhecido no Brasil é este outro, também conhecido como Sathya Sai Baba. O que nós visitamos é o Shirdi Sai Baba. Algumas dessas informações descobri na Internet hoje. Segundo a Wikipédia, Sathya Sai Baba diz ser a segunda de uma tríplice encarnação: teria sido Shirdi Sai Baba no passado e será Prema Sai Baba no futuro.

Um comentário:

Anônimo disse...

Quando você falou que ia para Shirdi, fui pesquisar no google, para ver onde ficava e do que se tratava e, cheguei a conclusão que você foi visitar o Sai Baba correto, este outro de camisa abóbora e cabelo Black Power ( Sathya Sai Baba) é um tremendo de um picareta, dizendo-se que é reencarnação do velho Shirdi e que será o Prema Sai Baba no futuro.
Para com isso, "sai baba".